A vegetação brasileira no OpenStreetMap - uma proposta de correspondência do Sistema Fisionômico Ecológico do IBGE com as etiquetas OSM

Posted by pedro_tharg on 5/24/2024

Esse texto é uma sugestão de etiquetagem da vegetação natural brasileira como classificada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em seu Manual Técnico da Vegetação Brasileira. É uma expansão e atualização do meu diário anterior em que proponho uma forma de mapeamento da Caatinga. O intuito é ser um suporte para quem tiver interesse em mapear áreas vegetadas no OpenStreetMap sem a necessidade de criação de novas tags e utilizando o que já está documentado na Wiki. Já esclareço de início que as tags disponíveis no OSM são muito limitantes para o mapeamento ambiental e, portanto, algumas liberdades foram tomadas. Além disso, o sistema de etiquetagem não pode ser muito complexo porque pode desmotivar o mapeamento por mapeadores iniciantes.

🌴 Sugestão de classificação da vegetação quanto ao porte (altura) 🌴

Para essa proposta, adaptei o que está descrito na Wiki acerca de Vegetação e vejo que quatro valores da tag natural ordenados em grau de porte (altura) seriam úteis. Resumidamente, os valores em ordem decrescente de porte são:

natural=wood > natural=scrub > natural=heath, natural=grassland.

🌳 Etiqueta natural=wood

Nesta sugestão, wood trata-se de uma vegetação “florestal”, densamente “arborizada” com árvores muito altas como presentes em fisionomias da Floresta Amazônica e Mata Atlântica. É o que temos no imaginário popular do que seria uma “floresta” ou “bosque”. Na classificação do IBGE, correspondem às Florestas Ombrófilas, Estacionais, Savanas Florestadas, Savanas Estépicas Florestadas e Restingas Arbóreas. Eu preciso destacar aqui que essa definição varia conforme o Bioma. Então, uma vegetação amazônica marcada com a etiqueta natural=wood não tem o mesmo porte que uma vegetação do Cerrado e Caatinga marcada com a mesma etiqueta. Porém, nestes biomas a vegetação mapeada apresenta um porte característico que mais se aproxima de uma “floresta densamente arborizada”. Algumas imagens a seguir do que poderia ser etiquetado dessa forma segundo essa minha proposta.

Floresta de árvores com copas altas e densas Floresta Ombrófila Densa da Amazônia, Bolívia. Link.

Floresta de árvores araucárias com copas altas Mata de Araucárias no Parna Aparados da Serra (divisa dos estados de Rio Grande do Sul e Santa Catarina). Link.

Visão do alto de uma floresta de árvores muito verdes Parque Estadual Morro do Diabo em Teodoro Sampaio - SP. Link.

Visão de uma floresta densa Cerradão (Savana Florestada) no Parna Serra da Canastra - MG. Link.

🌵 Etiqueta natural=scrub

Seguindo na classificação, temos a tag natural=scrub que é descrita na Wiki como “matagal”. É uma etiqueta cheia de controvérsias e aqui eu proponho que seja utilizada para a vegetação que tem o porte menor do que uma “floresta”. Neste sentido, há o predomínio de arbustos e árvores medianas que não alcançam os 20-30 metros frequentes nas Florestas Ombrófilas, por exemplo. Além disso, as copas das árvores não são tão densas. Inclusive, um dos critérios descritos na Wiki (aqui) para diferenciar natural=wood de natural=scrub é que a vegetação de scrub não fica sob uma copa de árvores que impede que arbustos e árvores menores recebam luz solar. É a vegetação mais frequentemente encontrada na Caatinga, Cerrado e Pantanal. Abaixo alguns exemplos:

Matagal com árvores baixas, esparsas e arbustos Campinarana Arbustiva em Mâncio Lima, Acre. Link.

Matagal com árvores baixas, esparsas e muitos arbustos secos Savana-estépica Arborizada (período seco) na ESEC Seridó, Rio Grande do Norte. Link.

Matagal com árvores baixas, esparsas e muitos arbustos secos Restinga Arbustiva na Ilha do Cardoso, São Paulo. Link.

🌿 Etiquetas natural=heath e natural=grassland

As duas últimas etiquetas representam o menor porte da vegetação, ou seja, herbáceas, gramíneas e outras plantas que não chegam a formar um dossel mediano como um matagal.

heath trata-se de um valor bastante confuso. A Wiki define natural=heath como um “urzal” ou “charneca”. Um local com vegetação arbustiva e lenhosa muito pequena. Ela recomenda utilizar essa etiqueta para qualquer ecossistema semelhante as fotos sugeridas na página. Particularmente, achei nada claro. Há também uma barreira regional nisto tudo, visto que charneca e urzal são utilizados para locais predominantemente áridos e pedregosos no exterior, mas no Brasil ganharam significados opostos, representando áreas com características pantanosas. Sendo assim, eu tomei como liberdade utilizá-la para classificar a vegetação rala em que predomina essencialmente arbustos e herbáceas raquíticas, sem considerar a presença de umidade. Esta classificação também pode apresentar uma fração arbórea mas as árvores se apresentam muito espaçadas uma das outras e geralmente são de apenas uma espécie. Como exemplo, as Savanas-Estépicas Parque no Parque de Espinilho, RS, os Parques de Carandás nos Pantanais Mato-grossenses e algumas formações como parque de palmeiras na Região Nordeste. A Restinga Herbácea e o “campo sujo” no Pampa também podem adquirir esse valor.

Matagal com árvores baixas, esparsas e muitos arbustos secos Restinga Herbácea. Link.

Matagal com árvores baixas, esparsas e muitos arbustos secos Savana-Estépica Parque no Parque Estadual do Espinilho, RS. Link.

Matagal com árvores baixas, esparsas e muitos arbustos secos Campo sujo (Estepe parque) no Rio Grande do Sul. Link.

Matagal com árvores baixas, esparsas e muitos arbustos secos Savana-Estépica Parque (período seco) no Parque Estadual do Seridó - RN. Link.

Por fim, a etiqueta natural=grassland possui o mesmo porte que natural=heath em relação à vegetação. A diferença é que natural=grassland já não apresenta espécies arbustivas lenhosas, mas sim há o predomínio de gramíneas. Equivale ao “campo limpo” dos campos do Pampa no Rio Grande do Sul (Estepe Gramíneo-Lenhosa) e à Savana-Estépica Gramíneo-Lenhosa ou “campo espinhoso” em outras regiões.

Matagal com árvores baixas, esparsas e muitos arbustos secos Campo limpo Estepe Gramíneo-Lenhosa (sem componentes lenhosos) em Aceguá - RS. Link.

🍃 Outras etiquetas para caracterização: leaf_type e leaf_cycle 🍂

A etiqueta leaf_type é utilizada para descrever o tipo de folhas encontrada na maioria das plantas no caso de uma vegetação. Pode assumir os valores broadleaved para angiospermas, o valor mais típico para os biomas brasileiros, needleleaved para plantas com folhas no formato de “agulha” como pinheiros, mixed para vegetação com os dois tipos presentes e leafless para a vegetação sem folhas como cactáceas, por exemplo. Expandindo um pouco mais o significado, decidi considerar broadleaved para plantas angiospermas e needleleaved para gimnospermas. Assim, conforme o Manual Técnico da Vegetação Brasileira do IBGE, no Brasil apenas a Mata de Araucárias (Floresta Ombrófila Mista) possui o valor needleaved. É importante frisar que esses valores valem para a vegetação originária com a etiqueta natural porque uma floresta de pinheiros utilizada para extração de madeira, por exemplo, recebe a etiquetagem landuse=forest + leaf_type=needleleaved. Além disso, não recomendo a utilização de leaf_type=leafless para vegetação presente no semiárido nordestino (caatingas) porque a presença ou não de folhas depende da estação e existe uma etiqueta para isso (descrita a seguir). Só recomendo caso o mapeador possua conhecimento suficiente para determinar que a maior parte da vegetação é constituída de cactáceas, bromélias espinhosas ou outras espécies sem folhas durante todas as estações.

leaf_cycle é outra etiqueta adicional que complementa a vegetação mapeada. Ela se refere ao ciclo das folhas ao longo das estações. Assume os valores evergreen para folhas que sempre permanecem verdes e não caem com o passar das estações, semideciduous para plantas que perdem suas folhas por um período curto de tempo, semi_evergreen aparenta possuir o mesmo significado que a anterior, deciduous para plantas que perdem suas folhagens totalmente durante um determinado período do ano e mixed para a ocorrência de ambos os casos. Neste sentido, as etiquetas que mais confundem são semideciduous e deciduous (ignorando semi_evergreen pois até o link do significado na Wiki redireciona para o significado de semi_deciduous). Assim, para diferenciar ambas, decidi usar a própria diferenciação do IBGE que considera semidecidual a vegetação em que a porcentagem de plantas que perdem suas folhas não ultrapassa os 50% em relação a vegetação inteira.

🍀 Etiquetas delimitadoras description e source:description 🍀

Enfim, nada impede que se adicione etiquetas bem mais específicas quando possível. Na etiqueta description pode-se usar o valor com o nome exato do Sistema Fisionômico (ex: description=Savana-Estépica Gramíneo-Lenhosa) e informar a origem desse termo na descrição. No caso do Sistema Fisionômico apresentado neste texto é o próprio IBGE, source:description=IBGE. Talvez até um ref:IBGE com o valor atribuído pelo instituto na sua própria legenda de classificação seja útil para ferramentas de busca (ex: utilizar ref:IBGE=D para Floresta Ombrófila Densa, ref:IBGE=Ta para Savana-Estépica Arborizada e assim por diante).

Com base nisso tudo, é possível gerar a seguinte tabela:

Tabela Tabela com a classificação de vegetação segundo o Manual Técnico da Vegetação Brasileira (IBGE) e correspondência com as etiquetas OSM. Tamanho completo.

E por curiosidade, utilizei as cores do renderizador padrão do OpenStreetMap para as classes de vegetação wood, scrub, heath e grassland e foi possível gerar o seguinte mapa de como ficaria a visualização do Brasil se as classes do Banco de Dados e Informações Ambientais do IBGE fossem importadas.

Mapas comparando antes e depois da importação dos dados de vegetação Comparação do Brasil como visualizado no OSM atualmente com a nova visualização caso os dados do BDiA fossem importados. Link.

🍂 🌿🌴🌵 Sugestões e opiniões são sempre bem-vindas! 🌳🌲🌻🍃